Gosto do gosto






Gosto de caminhar. De manhã, por preferência. Aliás, gosto das manhãs de verão como se gosta de um livro, novo, cheiroso, na estante. Mas, no inverno, me conformo com acordar e dormir diversas vezes e a sensação de paz que isso traz. Admito, sequer lembro das caminhadas.... Gosto de gente sincera. Essas que se perdem nas histórias porque querem contar cada detalhe e fazem analogias estranhas só pra te fazer parte daquele enredo. Gosto de ouvir histórias de desconhecidos. Sentar, tomar um chimarrão ao som de cânticos outros, como se nossa vida nada fosse. Como se cada dor nada fosse. Gosto de verde. Seja a mata, a rede na árvore, o contraste com o azul do céu. Aliás, azul do céu me lembra amor. Eu gosto do amor. Da forma como ele é simples e imenso, tão diferente do que as pessoas fazem dele. Esperando. Por vezes, tingindo. Demorei algum tempo para perceber que amor só é, não cobra, não espera. Ok, amor espera, sim, e isso é incontroverso. Acho que me expressaria melhor se dissesse que amor não cria expectativa, já que amor é expectativa por si só. Porque nina, fortalece (em palavras e sem elas). Amor é a certeza diária de querer seguir junto e ter forças para que isso aconteça. Gosto de escrever. Muito. Delinear cada leve sensação de paixão e pesar que me embriaga nas madrugadas -não mais tão insones. Tempos estes estava escrevendo meus sonhos, de forma poética. Fiz um pequeno livro de memórias encriptadas, como uma caixa de surpresas para um futuro próximo. Gosto da certeza que o tempo traz. Do gosto de dever cumprido a cada sexta feira de correria, quando chega no fim do dia. Aliás, eu gosto mesmo é do fim do dia das sextas-feiras. Chuva ou sol, o caminho é o mesmo e "gostar" já não denomina o sentimento de voltar pra casa. O que eu sinto, parafraseando Clarice, não tem nem nome. É gosto de calmaria. Virar de lado e dormir quente, no meio da tarde ou da manhã de domingo, quando acordo cedo pra fazer o café. Eu gosto de chuva. Dançar pela casa ao som de Betânia enquanto o mundo desaba lá fora e, por sorte do destino, a casa está vazia. Aliás, gosto das tardes. Tardes de pôr-do-sol-arroseado, nascer-da-lua-azulado que tanto aceleram meu coração. Eu gosto quando meu coração descompassa. Quando me inundo em lágrimas de um sentimento sem fim e tenho fé no mergulho. Eu gosto de quem tem fé, assim mesmo, sem entremeios. Quem acredita no mundo, nas pessoas e em como a gente pode ser melhor, com pouco. Com pouquíssimo. Gente que dá lugar no ônibus, gente que tira o carro para dar espaço para o outro estacionar. Gente que para na faixa de segurança. Gente que junta papel do chão. Gente que divide o chimarrão! Aliás, eu gosto de chimarrão. Vinte e quatro horas do dia. Tanto quanto café. Dois vícios mundanos que me prendem no meu quintal. Eu gosto de mapas-múndi. Sim. Eles me fazem perceber como o mundo é maior que o meu quarto e no quanto eu posso planejar, realizando ou não e, ah, eu gosto muito de planejar. Mas eu também gosto do gosto da ausência de planos. Quando acabo fazendo tudo aquilo que sequer imaginei, e da tempo pra tudo (impressionantemente), até meditar. Tenho gostado de meditar. Comecei com 15 minutos, meia hora. Hoje já faço 45 minutos de pura bravura e realização interna. Gosto da coragem. De quem tem culhão pra enfrentar as dores do mundo e ainda fazer graça. Quem tem sorriso largo e da tristeza faz prosa. Gosto de quem sorri com a alma! Daquelas pessoas que o olho fica pequenininho quando sorri. Me derreto. Me desmancho. Gosto de quem não pede pedágio pra saudade e vem correndo matar a distância. Gosto do silêncio -nosso silêncio- enquanto escrevo o mar de pequenas coisas que devo preencher na lista de "coisas que mais gosto de fazer quando estou sozinha", e de olhos fechados percebo que já não as imagino sem você. Gosto de mim com você e da pessoa que o nosso junto me tornou. Gosto da maneira como você me olha, mesmo eu estando um pouco acima do peso. Gosto das brincadeiras na beira do lago. Gosto das mensagens fora de hora. Gosto da sensação que essa tarefa me traz: de sentimento sem fim. Você me sorri com os olhos e me abraça dando abrigo. Gosto da gente contigo e da pessoa que a nossa simplicidade te tornou. Gosto do gosto da vida vivida em cada detalhe, quando o eu já se mistura com o nós e somos um eu e tu de verdades.

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