It's been almost two years

Ontem nós conversamos sobre como a vida tem sido rápida pra gente e sobre como tudo vêm como uma maré enorme de coisas que vai nos atropelando sem pedir licença. Eu tentei te consolar com as minhas meias-palavras e metáforas bonitas, mas tu estava inconsolável dentro da pressa que te impuseram, e como boa ariana, não escuta nada nem ninguém no meio do caminho.

Tu sempre teve esse calma oriental para resolver as tuas coisas, no teu tempo, e agora tudo te exige pressa. Não há tempo pra meditar, pra ouvir uma boa música ou ouvir um bom livro: é trabalhar e dormir. É pagar conta e colocar na planilha. É contar moeda. E, sim,eu sei, nunca foi assim. Assusta.

Há tempos que realizações de sonhos que tu nem sonhou vêm te atropelando e, mesmo se sentindo grata, tu não consegue remar em meio a esse mar gigante de coisas acontecendo. E eu entendo. Eu te entendo. Também tenho vontade de socar as paredes e depois chorar no teu colo como se eu tivesse cinco anos, mas fico silente frente às coisas que acontecem contigo e só o que posso fazer é te colocar no meu colo, te carinhar os cabelos e sonhar contigo com uma maré baixa.



Minha vontade é te pegar pela mão e largarmos toda essa loucura cotidiana.  Assistir documentários aleatórios no Bom Fim, fazer uma comida fresca com as tuas panelas-nada-convencionais, assar uma pizza na tua forma (que nem existe) e ter que cortar ela em pedaços pra caber. Acender incenso na Indonésia e agradecer aos Deuses todos pela oportunidade de parar e continuar. Por sempre haver uma chance de continuar o caminho, sem ponto final.

Tantas coisas banais que a gente sente falta, né? Eu também sinto. Tuas crises de riso, os bicos de choro, as músicas-pops-novas e os filmes indicados ao Oscar, Urso de Berlim, Palma de Ouro, Kikito. Todos. Os livros com os poemas mais bonitos do mundo, os cem sonetos de amor. As nossas noites estreladas na sacada, quando a maré ainda era baixa no continente nós.

Acontece que, depois que a maré sobe, as estações mudam. A lua muda. Depois que a maré sobe, ela não baixa mais. Acho que essa coisa de ser adulto é um pouco sobre aprender a nadar no mar, depois de só se ter nadado em piscina, sabe? É meio assustador, agitado, fundo e grande: mas depois da arrebentação, tem um horizonte inteiro para se observar. A dor e a delícia do que se constrói se mostra em um quadro gigante banhado pelo céu azul visto da beira da praia.

A gente vive tanta coisa dentro desse universo mágico de crescer, ter emprego, pagar contas, que só pela experiência de construir junto, a gente deixa a maré alta demorar e aprende a aproveitar a paisagem. Isso já vale a vida inteira. Mesmo que doa, dê medo, e tudo pareça meio impossível de se conseguir, a gente vai chorando baixinho no travesseiro até que um dia... não mais. E aí não vão mais haver dúvidas de onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar o aluguel ou aquele jogo de panelas lindo pra substituir as nossas. A gente só aproveita a vista.

Nesse maremoto todo, já se passaram quase dois anos do momento em que as nossas vidas viraram de cabeça pra baixo pela segunda vez. Desde então, a gente vem colecionando momentos de glória e desespero e as palavras me faltam quando eu penso em toda essa trajetória. Três mudanças, quatro empregos, concursos, especializações, cinco casas, dois apartamentos, formaturas, sonhos, brigas, e em nenhum momento a gente teve tempo pra curtir o processo.

A partir daí a gente começa a se culpar por não aproveitar o caminho, como tantas pessoas falam. "A felicidade está no caminho", eles dizem. Ocorre que não há tempo, e eu entendo o teu desespero todo. É como se a gente fosse um grão no meio desse universo de gente e pensamentos e sonhos e mudanças, sendo que, dentro da nossa espiritualidade toda, a gente sempre foi o centro da luz do universo todo.

Por isso, hoje eu vim te lembrar que, sim, tu é a luz do universo todo. Mesmo que o mundo te atropele, mesmo que a maré alta tente te afogar, mesmo que, por vezes, todo mundo pareça estar virado de cabeça pra baixo. Não é altruísmo nenhum falar do quanto o mundo gira positivo - e a gente gira positivo - quando as coisas vão bem aí do teu lado da fronteira. Então, lembra, que sempre dá pra parar e respirar, como tu tanto gosta.

Lembra que sempre vai existir o sítio.
Sempre vai existir a caminhada.
Sempre vai existir o colo.
Sempre vai existir o tempo.
E se o tempo não existir, a gente inventa ele.
Sempre vai existir o nosso amor. Por anos. Dois. Seis. Vinte.
Pra sempre.


... e sei lá, só sei que a sorte um dia vem.
Respira.


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