fomos donos do que hoje não há mais

De repente, quando tudo acaba, a gente se pega no escuro da vida e se assusta. Não é que não tenhamos certeza do que sentimos, mas é que no escuro só o que se pode saber está dentro. Quase inalcançável no meio do turbilhão de coisas passando por dentro de si. Esses são, portanto, dias de debate: a gente se debate no chão e debate as palavras agitadas que surgem. Não adianta correr, pois corre-se o risco de tropeçar. Não adianta parar: rio parado guarda bicho. Ontem, eu tive que saber de ti por dentro de mim. Deixei tua lembrança correr solta pra ver se achava lugar em algum canto bonito. Vi ela perambular por lugares de outras; nervosamente cocei a cabeça, impaciente levei as mãos aos bolsos, revoltosamente virei as costas e, por súbito cansada, deixei o erro se repetir. Nessa fase, a gente mal entende que apelido não se repete, característica é única e uma pessoa não substitui a outra. Com o passar do tempo, dentro de todo esse escuro, surge a revolta. É que quando a gente não sabe o que sente, agoniza o viver-cotidiano e tende a aniquilar tudo que se mexe. Tudo que lembra. Tudo que não é capaz de nomear. A gente concretiza o abstrato, revira o avesso. Arruma e desarruma. Arruma e desarruma. Arruma e... tende a chamar de amor o que visivelmente já deixou de ser. A gente só quer guardar o lugar do outro na gente e vice-versa. Mas, quem prende o sentimento que não tem mais lugar, está fadado a não se saber por dentro e não perceber que é impossível saber por fora, afinal, é o escuro da vida. A cabeça da gente vira uma confusão tão grande que acredita que o sentir vem de fora pra dentro: o que o outro faz influencia mais do que o que a gente sente, e toda essa gororoba de sentimentos, por sua vez, direciona o lugar onde o sentimento vai descansar dentro de si. Mas, se não se sabe de si, como se saberá do outro? Rogo, enfim, para saber de ti por dentro. Deixar deitar, deixar rolar... Até certo ponto apreciar tua vista, tua visita, tua estadia eterna nos aposentos da vida, no canto certo dentro de mim. Não vejo a hora de retirar as etiquetas das minhas feridas, de tirar todas as amarras que você deixou, afinal, para ser grande, deve-se ser inteiro. O primeiro passo já foi dado, aprontei as minhas próprias certezas e ouvi o eco: de repente, quando tudo passa, a gente se pega na luz da vida e se assusta, até que um dia não assusta mais. Que haja luz.






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