Fala!

O dia a dia, a correria, o trabalho cansativo, as pessoas mau humoradas: são infinitos os motivos pra gente deixar para lá  lá as coisas que não parecem grandes o bastante pra gente, principalmente dentro dos relacionamentos. Temos o hábito de nos sentirmos confortáveis demais quando tudo está em paz no namoro, deixando de lado as pequenas coisas bonitas da convivência a dois, iniciando a construção de uma parede que, meses ou anos depois, é pintada com uma frase em letras garrafais: O AMOR ACABOU - que temos o costume de bradar aos quatro ventos, como se a culpa fosse toda do destino. Claro que ninguém deve se culpar pela impossibilidade de perceber a necessidade do parceiro enquanto ser humano. É instintivo: o rei da selva só ataca quando algum outro leãozinho iniciante tenta se aproximar de sua rainha. É aquele velho ditado de que só percebemos o que tínhamos do lado quando perdemos ou estamos prestes a perder. Deixamos de lado o elogio bobo sobre a cara amassada de sono de manhã, guardamos o sentimento bonito de admiração pelo outro em cada conquista, inibimos quão bom é ser a companhia de alguém, como é bom ser e pertencer a alguém.
Isso me lembra aquela mania que a gente tem de mandar música no início do namoro. Músicas que narram as mais lindas histórias de amor, músicas que pedem, músicas que falam pela gente, não é? "Então case-se comigo em uma noite de luar, ou na manhã de um domingo a beira-mar, diga sim pra mim (...)", carregadas de sentimento, brindadas com um beijo, mesmo sem data especial, ainda que sem motivo, você dava um jeito de falar sobre amor.  Qual foi a última vez que você disse isso pra ela?
A maioria das pessoas passa pelas nossas vidas sem saber como elas modificaram nosso dia a dia, nossa forma de ver, pensar e agir. Ou vai dizer que você não muda completamente seu dia para poder ter aquele tempinho a dois? Que você não abre mão das coisas demasiadamente importantes que estão no caminho para incorporar seus planos aos dele? Os amores são o exemplo mais óbvio do que está lá, intocável, para ser mantido. Como em um museu, exposto. Convenhamos que, salvo as demonstrações genuínas corporais entre quatro paredes, todo o resto é fala. Todo o resto é comunicação. Todo o resto depende das coisas que você (não) diz e aí, na ausência de palavras, é fácil dizer que o amor acabou.
Qual o problema em falar pra ela que acha engraçada a risada dela e que ela fica ainda mais espontânea quando ela ri de você? Que amou aquele papo outro dia sobre as influências astrais sobre as suas vidas e que o lance sobre os filhos precisarem ser de libra é papo furado? Fala pra ela que você ama o gosto do café no beijo dela, que adora ouvir as músicas (des)afinadas que ela canta especialmente pra você quando pega o violão no canto da cama? Não espera até uma data importante ou um momento de crise pra dizer o quanto ela te faz feliz. Se não disser, escreve. Já parou pra pensar que a gente só fala pro outro da importância dele na vida da gente nas DRs e nas reconciliações? Nunca no cotidiano comum de dias úteis e banais. Fala pra ela logo. Fala pra ela sobre o quanto tu gosta do cheiro do cabelo dela e do quanto acha fofo ela ocupar quase toda a cama, praticamente te derrubando toda noite. Fala pra ela que você precisa dela. Fala sobre o que sua mãe disse sobre ela, mesmo que doa. Afinal, sua fidelidade é com ela e com as coisas que vocês compartilham. Não deixa morrer no peito tudo que você sente. Ela precisa saber. Você precisa que ela saiba também. Quer uma ajuda? Não precisa ser nenhum Shakespeare para dizer que ama a forma como ela cuida de você. Dizer que "romantismo não é pra você" é a pior desculpa pra ser omisso com alguém. Cuidado não é romantismo, cuidado é a base da casa onde vocês vão morar por longos e deliciosos anos. 
Por fim, aprendi que um amor bom é aquele cujo silêncio entre os dois não incomoda. Mas, o silêncio só não incomoda quando todas as coisas já foram ditas! Não falo de banalizar o sentimento, transformando o "eu te amo" em um "você já tomou banho hoje?" A gente não pode confundir  paz com omissão profunda de sentimentos. A gente não tem o direito de achar que não vai fazer diferença, que não é interessante, que não importa pro outro. É bem aí que a gente erra. É aí que a gente cala, consentindo com todo esse papo de "os relacionamentos não são mais como eram antigamente" ou "os amores não duram mais nada". O amor é uma construção de futuro ainda no presente e, como toda construção, precisa ser arduamente edificada tijolinho por tijolinho. Agora vem a parte mais importante do texto todo: esses tijolinhos são as palavras que você não diz. Manda uma mensagem. Liga. Manda uma música. Manda esse texto. Chama ela pra um café pra quebrar a rotina. Não deixa o amor cair na rotina pelas coisas que você não diz. Agora para de ler e vai, fala pra ela.

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