Tu vens chegando pra brincar no me quintal..

- Esses cigarros vão acabar te matando.
- O que me mata é a renúncia.
- Me dá uma tragada.
- Tu há de morrer por causa desses cigarros...


- Renúncia à que?
- À tua forma subversiva de amar.
- Cigarro de moça. Menta?
- Hortelã.

- O que te faz acreditar que ainda exista amor?
- Teu sim.

(Silêncio)

- Vais tragar todo o meu cigarro?
- Olha a chuva. Enxergas as cores por trás deste breu?
- Há cores. Há reflexão na chuva.
- Ao amor.
- Há amor.

- De onde tu vens?
- Vênus, ascendente em Sagitário.
- Libriana?
- Convicta. Leonino?
- Escorpião. Ascendente em virgem.
- Como consegue?
- Apenas vivo.

- Acho que a chuva vai acalmar essa semana.
- Não dentro de ti.
- Não dentro de mim.

(Acende outro cigarro)

- Dessa forma ficaremos horas jogados a inércia de um dia qualquer.
- Esperei anos.
- Séculos, talvez.

- Tu acreditas no que dizes?
- Qual parte?
- A história do amor...
- Amor não é história. É linha. Linha de tecer vida.
- Sem amor não há vida?
- Não há vida sem amor.
- Não à vida sem amor.
- Apesar de tudo?
- A pesar tudo.

- Dá-me teu consolo esparso.
- Dou-te a tutela de minhas dores.
- Dá-me agora mais uma tragada.
- Café?
- Sem açúcar.

(Silêncio)

- Ouves o silêncio?
- Onde?
- Dentro de tuas palavras não ditas.
- Ouço o desespero.
- Onde?
- Dentro das palavras não ditas.


- Amargo.
- Só a vida.
- Não, o café.
- Sim, o café.


- Lês-te o último conto de Caio Fernando?
- Dolorido.
- Encontro.
- De Júpiter com Saturno?
- Vênus com Plutão.
- Nós.
- Há?
- Sempre houve.

(Silêncio).

- Paramos?
- Parei onde você parou.
- Volte daqui uns anos.
- Estarei durante estes anos.
- Estará.


- Escuta. Me deixa um cigarro? Preciso de algo para suprir.
- Você já tem mais que isso.
- Eu?
- Eu.

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