Sobre amar e confiar

Amar e confiar são a mesma coisa. Demorei a perceber. Por isso confiamos em pouquíssimas pessoas em nossa vida. E podemos passar uma vida inteira sem confiar em ninguém.  É tão difícil confiar quanto amar. Tão raro. A confiança e o amor são conquistados. Exigem tempo, observação, sinceridade, lealdade, soma de atitudes. Não é porque é sua mãe ou seu pai ou seu irmão que você vai confiar. Família não traz garantias. Confiar não é genético. Confiar é intimidade recompensada. Confiar é recíproco. É quando damos e recebemos simultaneamente. Confiar é contar um segredo e ver, já no finzinho de nossa história, que nunca foi revelado. É uma previdência privada de nossos mistérios. É quando as ações comprovam as palavras. Confiar não é para os apressados, mas representa o retorno de uma longa viagem mental. É a velhice dos nossos hábitos, a velhice das nossas frases, a velhice de nossos juramentos. É quando um gesto recebeu a proteção do silêncio. Quando alguém confia sem conhecer, na verdade, está esperando confiar. É uma aposta para tornar mais fácil a convivência. Demonstramos despojamento no início das relações, mas somos complexos no decorrer da cumplicidade. Entregamos a chave da nossa casa para perguntar todo dia se o outro não a extraviou. E perguntar é desconfiar. No máximo, confiamos desconfiando. Com o pé atrás e um olho lá na frente. Confiamos com medo de confiar, sofrendo o receio de ser enganados, tremendo por depender de alguém, temendo pela nossa vulnerabilidade. Assim como o amor. Falamos que amamos antes de amar, para nos convencer de que é amor. Falamos que confiamos antes de confiar, para nos convencer de que é amizade. Confiar é se desiludir, é se frustrar, é se decepcionar. Assim como o amor. É criar as mais altas expectativas e depois se acomodar com o que é possível. Como o amor. É aparecer com todas as certezas do mundo de que aquela é a pessoa certa e descobrir, aos poucos, que ela mente e pensa torto como você. Confiar dói. Como o amor. Ainda mais quando a confiança é quebrada e não há como restaurá-la com discussões, colá-la com desculpas, consertá-la com declarações grandiloquentes. Confiar é ter uma relação única com alguém, inimitável, e não dividi-la com um terceiro. É o contrário da falsidade, que significa ser igual com todos fingindo diferença e exclusividade. Deve-se desamar para amar de novo.

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